sábado, 27 de outubro de 2012

Urban Outlaw - Magnus Walker

Imagine-se o esteriótipo de dono de um Porsche.

Magnus Walker está o mais longe possível desse esteriótipo. Um estilo entre o americano red neck e o rastafari, mas que é tão pessoal e único que justifica o sucesso da sua linha de roupa Serious Clothing, criada por si, e à sua imagem.

Magnus Walker

Mas claro, não estamos aqui para falar de roupa.
Magnus é conhecido sobretudo - para nós, petrolheads - pela sua obsessão por Porsche 911.

Tudo começa quando tinha 10 anos e o pai o levou ao Salão Automóvel de Londres, em 1977, e viu um Porsche 911 / 930 Turbo com a decoração da Martini Racing.
Porsche 911 Turbo (930)

Ficou rendido aos 911 para sempre.
Chegou a escrever uma carta à Porsche, a dizer que gostava de desenhar carros para eles. E responderam! Dizendo, basicamente, que quando fosse mais velho, lhes dissesse qualquer coisa...
Acredito que o que faz hoje tenha a total aprovação da Porsche, mas já lá vamos.

Aos 19 anos foi para os EUA, com uma mochila ás costas e nada mais. Começou a vender roupa, feita por si e a partir de roupa usada que comprava em vendas de garagem, numa banca em Venice Beach.
Aos 25 anos comprou o seu primeiro 911. Passados 20 anos já foram mais de 40 os 911 que teve.

Foi no entanto nos últimos anos que Magnus ganhou visibilidade, com a construção de alguns 911 com aspecto e setup de streetable track type cars (desculpem mas não estou a ver uma tradução correcta para português desta expressão, talvez algo como carros de pista legais ou algo do género, mas não soa bem).

Porsche 911 68R 

Construções como este 911 68R mostram o porquê da popularidade que Magnus tem. Ele coloca o seu toque sem nunca chocar com o design original da Porsche, tornando estes 911 em vintage racers cheios de agressividade e de uma "rudeza elegante" extremamente cativante.

Claro que as suas criações não vivem só de um exterior personalizado.
Este mesmo 911 68R conta com um bloco 2.5l de curso curto feito a partir do bloco de alumínio do 2.0l de 1966, com cerca de 220cv. A caixa de velocidades é também alvo de melhorias e incorpora agora um diferencial autoblocante.
A suspensão utiliza componentes de 911 SC e mesmo de RSR, combinados com amortecedores Bilstein e barras de torção e estabilizadoras totalmente reguláveis. Toda a travagem é também revista e modernizada.






Estas criações reflem também como Walker vive a sua paixão. Os seus carros não são peças de exposição, são carros que ele usa, abusa, goza, tira todo o partido deles, mesmo depois de gastar somas avultadas neles. Magnus Walker é sem duvida, e felizmente, um coleccionador fora do normal.





É também um fora da lei, por usar a baixa da Los Angeles como a sua pista de testes, por se ter fartado dos autódromos que frequentou nos inúmeros track days em que participou. E porque na verdade conduzir um grande carro, numa grande estrada, com uma grande vista, é aquilo que todos nós queremos e gostamos.



A sua casa / garagem é também o sonho de qualquer petrolhead. Um antigo armazém comercial em tijolo na baixa de Los Angeles, restaurado com extremo bom gosto, onde autênticas obras de arte de 4 rodas convivem com memorobilia automóvel, blocos de motor, painéis de carroçaria, rolos de tecido, caixas de velocidades, etc.










O pequeno vídeo / documentário Urban Outlaw capta com precisão um pouco da aura de Magnus, da sua visão e paixão. Para além disso tem uma edição e imagem brilhantes, tirando partido da baixa e envolvente de Los Angeles como fundo, e dos 6 cilindros boxer como banda sonora.

Obrigatório ver, e rever!

O trailer:



Link para o vídeo aqui.

Há homens de sorte

Esta é uma história, como tantas outras, em que a vida nos separa das coisas que gostamos.
Mas esta tem um final feliz.

Michael Hilti (presidente da conhecida Hilti) teve um Bmw 2000 Touring de 1972. Acompanhou-o durante a década de 70, e adorava-o. No entanto por questões pessoais teve de se desfazer dele. Mas nunca o esqueceu.
E a sua esposa, que o conheceu com esse mesmo Bmw, também não. E não descansou até encontrar esse mesmo Bmw. Estando num estado quase irrecuperável, não hesitou e entregou-o à Bmw Classic, que fez um restauro extensíssimo, deixando-o numa condição melhor que novo, e com uma nova "alma": motor com preparação Heidegger a debitar 170 cv, e exterior com toques - guarda-lamas e jantes - Alpina.

Depois foi só entregar a "prenda" a um surpreendido e emocionado marido, conforme mostram as fotos.

Ao fim de 30 anos, o reencontro.







terça-feira, 16 de outubro de 2012

Bizzarrini Manta - Bizzarrini Duca d'Aosta Coupé



Giotto Bizzarrini é um dos grandes nomes da industria automóvel do século XX.
Bastará referir que o incrível V12 que a Lamborghini usou, sem grandes alterações (exceptuando cilindrada, injecção e lubrificação), desde o início os anos 60 até à poucos meses, com a introdução de um novo V12 no Aventador, foi desenhado por Bizzarrini.
Não menos importantes foram os seus contributos na Alfa Romeo, Iso e mesmo na Ferrari, onde contribuiu no desenvolvimento dos 250 TR, 250 GT SWB e 250 GTO.

Sua criação são também os dois carros referidos no título do artigo, que se destacam por serem expoentes do design automóvel da década de 60.

No início da década de 60 Bizzarrini sai da Ferrari em conflito com Enzo, e estabelece a Prototipi Bizzarrini, e presta serviços de design e consultoria a outros construtores, como a ATS, Lamborghini, e a ISO, se calhar mais importante que todos, pois estaria na origem da Bizzarrini S.p.A. alguns anos mais tarde.
Renzo Rivolta, proprietário da ISO, que produzia desde frigoríficos e scooters, aos pequenos Isetta,  pretende alargar a gama de veículos, produzindo um GT. Adquire os direitos de produção do britânico Gordon-Keeble e com Bizzarrini cria, em 1963, o ISO Rivolta GT, um elegante e rápido coupé 2+2, propulsionado pelo V8 usado pela Chevrolet no Corvette.










O sucesso conseguido com o Rivolta GT impulsionaram-nos para um projecto ainda mais ambicioso, a criação do GT mais rápido do mundo. O resultado deste projecto foi o ISO Grifo A3L (L de Lusso), um deslumbrante coupé desenhado por Giugiaro (ainda a trabalhar na Bertone), construído sobre um chassis curto do Rivolta GT, utilizando novamente o V8 Corvette de 5.3l. 








O Grifo foi uma criação incrível mas Bizzarrini, sendo um homem das corridas, aproveitou a base do novo GT para criar, separadamente da ISO, uma versão de competição, o Grifo A3C. Este usava o mesmo chassis "cortado" do Rivolta GT, com a suspensão frontal por triangulos sobrepostos e eixo DeDion traseiro, mas olhando para as duas versões era dificil de imaginar.
 O Grifo A3C era extremamente baixo e aerodinâmico, com uma carroçaria em alumínio esculpida mais uma vez por Giugiaro e construídos por Piero Drogo, e com o motor colocado tão atrás no chassis que o acesso aos distribuidores era feito por aberturas no tablier! 

Os carros são apresentados no Salão de Turim de 1963 e são um enorme sucesso. São feitas algumas encomendas, inclusivamente de versões de estrada do Grifo A3C, que com 365cv (405cv na versão de competição) e um comportamento irrepreensível é unanimemente aclamado pela imprensa automóvel.
As primeiras provas do Grifo A3C são também promissoras. Apesar de problemas de fiabilidade, normais para um carro em início de desenvolvimento, o seu comportamento e velocidade dão-lhe o 10º lugar nos treinos das 24h de Le Mans de 1964. Acaba em 14º por uma falha na colocação de uma nova pastilha de travão, que obrigou a uma paragem na box de 2 horas. Em 1965 ganha na sua categoria. 

Durante esse ano dá-se a cisão entre Bizzarrini e Rivolta. Este queria que Bizzarrini prepara-se a produção em série da versão de estrada do A3C, mas Bizzarrini estava apenas concentrado em evoluir a versão de corrida. 
A ISO fica com a produção do Grifo A3L, e Bizzarrini continua com a produção independente do A3C, agora chamado Bizzarrini 5300 GT, em três versões: Strada, Corsa e America, com carroçaria em fibra de vidro e suspensão traseira por triângulos sobrepostos.






Até 1968 foram construídos entre 104 a 115 unidades do 5300 GT (a informação existente não é conclusiva neste ponto), dos quais 3 eram versões descapotáveis, o 5300 SI Spyder Prototipo apresentado em 1966 no Salão de Genebra, e outras 2 unidades 5300 SI Spyder, ligeiramente diferentes do Prototipo. Para mim serão as versões mais bonitas do 5300 GT. E extremamente engenhoso: graças a um interessante sistema de tejadilho rígido podia alternar entre totalmente descapotável, targa ou coupé.











Bastante interessante e ainda mais raro é a versão "low-cost" do 5300 GT.
A venda das versões Strada do 5300 GT não eram suficientes para financiar a empresa, e Bizzarrini pensou em criar um desportivo mais acessível, que fosse possível produzir em série. Aproveitando as boas relações que tinha com a General Motors, fornecedora dos motores que usava nos Bizzarrini, pensou em sugerir um desportivo para a Opel. Apresentado em 1966, o 1900 GT Europa era na prática uma versão "miniatura" do 5300 GT, com um motor 1900 Opel. 
Infelizmente a proposta não encontrou apoio na GM, que escolheu ao invés uma proposta interna, com um design semelhante ao Corvette Stingray e que daria origem em 1968 ao Opel GT. Infelizmente pois a proposta de Bizzarrini, para além de mais bonita (opinião pessoal) era mais avançada mecanicamente, com suspensão independente à frente e atrás, discos de travão nas 4 rodas, distribuição de peso ideial, etc. 
Bizzarrini no entanto não desistiu e acabou por produzir o 1900 GT Europa, ainda que poucas unidades: 12 com motor 1.9l Opel e 5 com motor Fiat.










Apesar das dificuldades financeiras, Bizzarrini nunca conseguiu refrear o seu entusiasmo pela competição, e inicia em 1965 a criação de um protótipo de motor central para defrontar gigantes como Ferrari e Ford.
Em apenas 6 meses o primeiro chassis tubular estava construído, com duplos triângulos sobrepostos e travões de disco nas 4 rodas, e preparado para suportar o potente V8 Chevrolet. Nascia o P538: P de "posteriore" ou motor traseiro, 53 da cilindrada do V8 5.3l e 8 por ter 8 cilindros. O V8 debitava neste modelo 365cv, que transferia ás rodas por uma caixa ZF de 5 velocidades.
Curiosamente o primeiro cliente encomenda o seu P538 com um V12 Lamborghini (o tal desenhado também por Bizzarrini). 










No entanto a história do P538 não foi a melhor. Carros danificados em testes, falhas mecânicas na primeira participação em Le Mans 1966, e um impedimento de participar com o mesmo carro em 1967 por razões desconhecidas mancharam o inicio da carreira do P538. 
Em 1968 é ainda pior, com a mudança de regulamentos, que passam a exigir um mínimo de 50 carros construídos, impedindo o P538 de competir.  Bizzarrini vê-se em mãos com vários carros prontos mas sem utilidade e tenta vende-los a clientes particulares, substituindo a carroçaria Barchetta por uma carroçaria Coupé, mais prática e fácil de classificar em outras categorias de competição.

É aqui que começa a história dos dois carros que estão na origem deste artigo. 
Um dos clientes destas unidades foi o Duque de Aosta, mas este não cabia no interior da nova carroçaria, e Bizzarrini constrói uma especifica, ficando este carro conhecido por Bizzarrini P538 Duca d'Aosta Coupé. 
Apesar da nova carroçaria e interiores aumentarem o peso em cerca de 250kg (total 1200kg) face à versão de competição, é ainda um carro extremamente rápido, com o seu V8 de 365cv. 
Mas acima de tudo é a sua beleza que se destaca, que com uma carroçaria feita pelo próprio Bizzarrini apenas para acomodar o Duque, se arisca a ser um dos mais belos automóveis já feitos, e um exemplo perfeito da beleza automóvel dos anos 60.









O outro carro em questão é o Bizzarrini Manta, criado por Giugiaro que tinha acabado de sair da Bertone e fundado a sua ItalDesign em Turim. O Manta é o primeiro trabalho da nova empresa.
Aproveitando a boa relação que mantinha, dos trabalhos anteriores, Giugiaro convenceu Bizzarini a ceder um dos chassis rolantes V8 para criar um carro de design futurista, acordando que quando o carro fosse vendido dividiriam os lucros.

Giugiaro desenhou um carro fora do normal para altura, em que as três secções normalmente presentes num carro (frente, habitáculo e traseira) desapareciam. O Manta tinha apenas uma linha continua desde a frente até à traseira cortada estilo "Kamm tail".
Na frente existiam três aberturas por baixo do pára-brisas que permitiam melhorar a visibilidade a baixa velocidade, sendo fechadas a alta velocidade para conseguir a brilhante eficiência aerodinâmica que permitia, segundo dados revelados na altura, uma velocidade máxima de 330km/h! 
















No interior, aproveitando a enorme largura do chassis de competição, Giugiaro criou um cockpit com três lugares, confortável e até luxuoso, que pouco tinha a ver com o interior despido do original P538. Para facilitar a entrada do condutor o selector da caixa de velocidades é bastante pequeno e a coluna de direcção reclinável.  




O carro foi apresentado no Salão de Turim de 1968, na cor verde que surge na fotos e foi um enorme sucesso, fazendo mesmo capa de revistas como a Road&Track.
Depois de Turim foi repintado em vermelho com riscas brancas e azuis para ser exibido na Tokyo Racing Car Show e Los Angeles Auto Expo, mas quando regressava para Itália foi perdido, aparecendo apenas em 1978/1979 na alfandega do porto de Genoa. O carro foi restaurado à sua condição original que mantem até hoje.